domingo, 13 de março de 1994

Entrefechada rosa

          Foi dito que Maria Carpi começou a escrever muito cedo. Que se deixou absorver por uma profissão cujos caminhos podem ser luminosos como aquele que escolheu : lutar pelos direitos da criança e pelo acesso dos pobres à justiça. E que se desfez de seus primeiros textos para reiniciar sua obra poética, já na maturidade.
         Há muito pouco tempo esta obra está vindo à luz. Em 1990, o seu livro de estréia, Nos gerais da dor, pu­blicado pela Movimento recebeu o prêmio “Revelação Poesia da Associação Paulista dos Críticos de Arte” e o prêmio “Érico Veríssimo” da Câmara dos Vereadores de Porto Alegre.
         No ano seguinte, a mesma editora lançou Desi­derium/Desideravi ou como se esclarece na folha de rosto, o desejo de desejar-te.
         Um livro construído em oito cantos cada um deles possuindo um número desigual de poemas. Os seis primei­ros têm como título elementos da natureza que, no entanto, não se constituem o cerne do poema, mas elementos invocados para expressar o que o pudor da voz poética torna indizível.
         O amor, o amado, o ato amoroso, os caminhos da alma emergem desses versos de Maria Carpi tão profunda­mente puros que é como se somente palavras fortemente suges­tivas - árvore, água, fruta, pedra, fogo, luz - pudessem ser deles o símbolo.        
         Sem dúvida, um eu feminino que se revela no hermetismo buscado em distantes versos barrocos e na concisão que regulamenta o exibir dos sentimentos.
         Na prisão das palavras encobridoras, a ânsia da entrega, o entrelaçamento perfeito do corpo e da alma, o se sentir chegar às origens da vida se deixam, no entanto, perceber.
         As palavras se combinam, perfeitas, e cada verso constrói um mundo de certezas e de dúvidas girando em torno do amor, do erotismo, da procura e do encontro de si mesma e do outro.
         A voz de quem, ainda que amando profundamente não abdica de pertencer ao mundo e de conhecer-lhes as leis e que, ao se levantar, não fica encerrada nos limites do indi­víduo mas alcança tons que podem ser de todos.
O grande suplício não está nas trevas do corpo. Mas nas chagas da luz. O grande suplício não está no amor que se afasta. Mas no afastado que permanece. O grande suplício do que parte com a permanência e do que fica com a vacância. Num só fruto.

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