Paródia campeira do regresso de Ulisses, assim definiu Sérgio
Faraco a história de Ranulfo González.
Deixado por morto num dos
muitos combates do Continente, quando o inimigo se retirou, arrastando-se, ele
chegou até as terras de um espanhol que, sabiamente, em brigas de galo e de
uruguaios, se conservava neutro.E, então, o tratou, o curou e lhe deu trabalho
para que pudesse comprar outro cavalo pois o seu, os vencedores da refrega
haviam levado.
Dois anos depois, Ranulfo
González cavalga de volta para casa onde deixara mulher e dois filhos.
Antes, porém, de chegar ao
casario, perto da sanga, a boa estrela que o vinha acompanhando faz com que se
encontre com a sogra que lavava roupa. Por ela sabe que tido por morto, outro
homem já ocupara o seu lugar.
Com cuidado, ele desencilha
o cavalo, lava-lhe o lombo e o maneia com folga. E diz que a mulher deveria
escolher entre os dois homens e que iria acampar ali mesmo para lhe dar tempo.
Esperaria pela resposta na manhã do dia seguinte.
Mario Arregui, o contista
uruguaio o chama de Ulisses - o regresso de um combatente de guerra perdida - e
chama de Penélope sua mulher que ao acreditá-lo morto, prontamente o substitui.
Uma recriação que, no Continente, se enriquece por um sábio, ingênuo e
espontâneo adaptar-se à vida.
Os personagens de “O
regresso de Ranulfo González” não se amesquinham diante da vida e de seus
senões, como, em geral, sucede com os personagens dos outros contos de A cidade silenciosa do qual ele faz
parte.
Na melancolia de mundos sem
perspectivas ou que estão a se acabar que prevalece na coletânea, irrompe esse
amor pela vida que faz com que, pacientemente, Ranulfo González recuse a morte
e recupere a mulher já nos braços de outro.
Porque no dia seguinte
chega-lhe a resposta: A Felipa te espera.
Como sem se surpreender, ele ainda tomou uns mates, encilhou lentamente o tordilho e regressou ao rancho como se dele
tivesse saído naquela mesma manhã. E tudo voltou a ser como era antes da guerra.
Mas fora nela que Ranulfo
González escapara de ser degolado e por horas ficara entre os mortos. E quando
lhe haviam roubado as roupas e o cavalo. Em troca, ficara com uma bala alojada
no corpo que o incomodava bastante, mas que, também, servia para anunciar
chuvas e tempestades.
Enquanto isso, um daqueles acordos de cavalheiros que nunca
são cumpridos havia dado à guerra um ponto final, que não valia mais do que um
ponto e vírgula.
A cidade silenciosa foi traduzida por Sérgio Faraco e publicada pela Movimento de Porto
Alegre, em 1985.

Nenhum comentário:
Postar um comentário