Apresentado pela Editora
Movimento de Porto Alegre como um romance que resgata um outro Rio Grande e um outro
Brasil, suas quatrocentas páginas tem por eixo narrativo uma abastada
família do extremo sul do país. Revelando seus dramas, situando-a em exatos
momentos econômicos e políticos do Rio Grande do Sul, Luiz Antonio de Assis
Brasil, entrelaçando ficção e realidade, alcança a síntese sedutora que permite
descobrir aspectos de um abrangente itinerário nacional através de uma
sugestiva fabulação.
Conduzindo uma narrativa de
múltiplas vozes, como já o fizeram tantos autores do Continente, que se
situam no tempo e no espaço em níveis distintos, o romancista instaura nela uma
expressiva vivacidade que, no entanto, sabiamente se ameniza quando se detém em
Plácida. Como Camila de Manhã transfigurada ou como Micaela de
As virtudes da casa, Plácida é admirável
criação de um inusitado universo
feminino.
Em idas eras, numa cidade
provinciana, mulher rica e de frágil, saúde, ela aceita esse mundo ao qual
pertence, o suficiente para se casar com aquele que a pretende, para ignorar o
sítio onde passa a morar, o estabelecimento charqueador, maculado
por ossadas e odores fétidos, para ceder à vontade do marido e aceitar viver
numa longínqua estância.
E, refugiada na música, na
leitura dos românticos franceses, nos bordados, nas lembranças da adolescência,
nos seus deveres feminis, deixa-se viver, rodeada de luxo e de atenções, como se a vida mal a tocasse e sem entender que a moléstia que a persegue
nada mais é do que a linguagem que outrora fora abafada na sua sincera
espontaneidade pelas pesadas normas sociais. As mesmas que mais tarde a devem
prender, intocada, nos seus trajes de viuvez e que, então, ela irá infringir
para obedecer a seu corpo que as carências fazem desfalecer em crises de
dispnéia.
Infração, cujo ônus será em
demasia: não se vê a salvo das sufocações; não é invadida pela felicidade; o
que recebe das noites amorosas não anulam seus anseios.
As teias em que se enredou,
em que foi enredada, foram implacáveis. Num caixão de ouro Plácida desce à terra,
porque, transgressora, na terra não mais havia lugar para ela.
Na galeria feminina do
romancista gaúcho, também é imagem poderosa. Mas infeliz e vencida.

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