Antes de voltar-se
exclusivamente para essa poesia belicosa, militante, que procura e prega uma
forma social diferente para viver, antes de voltar-se para a dimensão religiosa
que orientará sua vida a partir de 1957, ano em que decide pela vida religiosa,
Ernesto Cardenal fez poemas de amor.
Escritos entre 1952 e 1956,
esses pequemos poemas fazem parte de Epigramas,
publicado no México em 1961.
Vivendo na clandestinidade
quando Somoza domina a revolta de abril de 1954 que se levantara contra ele e,
profundamente, integrado a seu povo e a seus valores, essa experiência estará
presente nos versos de então, cuja matéria poética nada despreza desse
cotidiano em que vive. Tudo é poesia.
Tudo pode se tornar poesia, ele dirá.
E, assim, é de um instante
fugidio, passageiro, de um acontecer aparentemente muito simples e ingênuo que
se fazem seus versos de amor.
Ou para Claudia ou para
Myriam ou para aquela que não foi nomeada, mas sempre mulher distante,
inatingível devido a desencontros irreversíveis. Então, na estrutura
lingüística clara, linear, transparente, se insere a imagem barroca, didática,
sobre o passar irredutível do tempo, sobre a natureza que se renova, sobre os
sentimentos mortos que jamais tornam a existir.
Mas, sobretudo, o que
prevalece no poeta é a confiança no porvir de seu verso (que o uso do advérbio
“talvez” não consegue dissimular) que um dia será conhecido em toda a América
Hispânica.
Confiança ligada à convicção
da importância de sua poesia amorosa na medida em que irá salvar a palavra, a
linguagem de seu povo que foi distorcida pela ditadura. E, principalmente,
porque os seus poemas irão sobreviver ao Ditador, essa terrível sombra a
dominar o país que se mescla à poesia de Ernesto Cardenal, para fazer dela uma
arma de combate ainda quando aspira ser expressão de amor.
Mas, por vezes, o lirismo se
sobrepõe e o poeta vive um momento em que só o amor importa.
Ao te perder,
perdemos tu e eu: eu porque tu eras o que eu mais amava e tu porque eu era o
que te amava mais. Mas de nós dois tu perdes mais do que eu: porque eu poderei
amar a outras como te amava a ti mas a ti não te amarão como te amava eu.
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