Em 1979 foram publicadas
duas Antologias de Ernesto Cardenal: Poesia
de uso pela El Cid de Buenos Aires; e Antologia poética pela Salamandra do Rio de Janeiro, cuja seleção
de poemas e tradução foram realizadas por Paulo de Carvalho Neto, enriquecida
por um prólogo assinado por Dom Pedro Casaldáliga, Bispo de São Félix do
Araguaia.
Tem por título "Prólogo
solidário" e é uma pequena e imensa declaração de fé nesse sonho de
América Livre que o une ao poeta nicaragüense. Estamos de acordo contigo,
Intérprete de nossa Hora e da Terra nossa, escreve Dom Pedro Casaldáliga,
sensível e consciente conhecedor da terra em que lhe coube viver não ignorando
quão parecida ela é com as demais terras do Continente cujos governos, quase
sempre, foram usurpados direta ou indiretamente, por uma medíocre escória que
tudo destrói para lucrar em nome de si mesma.
Por sua vez, no longo poema
“Epístola a Monsenhor Casaldáliga”, Ernesto Cardenal fala desse Brasil oprimido
e explorado, desse Bispo que nas distantes terras do Araguaia lê os seus Salmos e que um dia disse: a escravidão não é uma metáfora.
E, claramente, como em todos
os seus versos, o poeta enumera os negócios escusos, os crimes, o genocídio sob
cuja égide se abrigam as dicotomias, as
luzinhas dos miseráveis ribeirinhos
e, distante, o riso das luzes do Rio de Janeiro e de Brasília, o milagre
brasileiro de um Hotel Hilton rodeado de favelas.
Designando sons, imagens e
fauna e árvores e pobres homens miseráveis os topônimos Mato Grosso, Xingu, Rio
de Janeiro, São Paulo são uma certeza sobre o universo a que se refere. E
denunciando prisões, torturas e mortes, Ernesto Cardenal não elude o Brasil
desse Continente que ele quer salvar.
Utopia que o irmana com Dom
Pedro Casaldáliga, o Bispo de São Félix do Araguaia. Inimigos ambos das
injustiças, ambos sustentados pela fé cristã e pelo amor dos deserdados.
Monsenhor, somos subversivos / número secreto de uma ficha de um
arquivo quem sabe onde, / seguidores do proletário mal vestido e visionário,
agitador, / Professional, executado por conspirar contra
o Sistema, diz Ernesto Cardenal na “Epístola a Monsenhor Casaldáliga".
E o Bispo de São Félix do
Araguaia termina o seu "Prólogo solidário" inspirando-se em versos de
Ernesto Cardenal para dizer: Estamos
olhando a lua (saturada de sangue mártir) / e as árvores da selva (queimadas e
renascendo) / para saber quando haverá mudança de poder / E sabemos que nosso
dever, como o teu, é nascer de novo. / Juntamente com a América Latina.
No Continente, "a
Pátria Grande", suas vozes se levantaram e se encontraram.



