domingo, 12 de janeiro de 1992

A escrita do exlio II


            O exílio  será uma palavra chave deste decênio diz um personagem de Primavera con esquina rota, romance de Mario Benedetti, publicado em Buenos Aires, pela Nueva Imagen, em 1986. Palavra chave e que encerra  significados vários. Muitos foram os países que obrigaram seus cidadãos ao exílio e grande, o número dos que se exilaram. Com exceção do Brasil – que razões explicariam esse não comprometimento do escritor com os destinos de seu povo? – não houve país latino-americano que não tivesse no exílio os seus melhores escritores.  Os textos produzidos então, puderam ser englobados sob a rubrica “Literatura do  exílio” que, evidentemente, como qualquer outro rótulo, se tornou impreciso ou insuficiente na medida em que o próprio exílio foi permitindo caracterizações: exílio interior, exílio intelectual ou existencial, ausência do próprio país, produção e publicação em país estrangeiro, tema do exílio na obra, por exemplo.

            Da “Literatura do exílio” a sua quantidade e qualidade justificam o aparecimento de importantes trabalhos críticos que, ao se deterem no tema do exílio e nos recursos estruturais e estilísticos que os construíram, tiveram que se deter, também, no panorama político-ideológico do país que obrigou ao escritor esse abrupto desenraizar-se. Cumpre-se, assim, o desejo do escritor: a luta empreendida contra as opressões se enriquece de novas vozes e seus contornos – a entrega gradativa do próprio país à cobiça estrangeira, a condução do povo para a miséria sempre crescente – tornam-se mais precisos. E, muito nítidas, as relações da Opressão com seus cidadãos.

            Num dos textos auto-biográficos  que  Mario Benedetti  insere no romance Primavera con esquina rota, ele narra dessa violência que o arranca de seu exílio no Peru e o lança de volta a Buenos Aires de onde já tivera que sair, ameaçado por grupos extremistas de direita: uma repetição hodierna encenada por humanos da fábula de La Fontaine “O lobo e o cordeiro”.

            Exilado no Peru, fugindo das ditaduras do Uruguai e da Argentina, num fim de tarde, de repente, autoridades policiais peruanas lhe concedem duas horas para deixar o país. No aeroporto, quando o deixam perto dos degraus para subir no avião, o inspetor de polícia lhe estende a mão e lhe diz: O senhor vai embora, certamente, ressentido com o Governo, mas não tenha ressentimento com os peruanos.

            Os peruanos, eles, como também os uruguaios e os argentinos, ignoravam essa tragédia que Mario Benedetti devia enfrentar por defender princípios e o direito de expressão. E’evidente, que mesmo depois de seu testemunho, a continuarão  ignorando (como a tantas outras) porque os livros, no Continente, são destinados somente a alguns poucos.

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