Em
Compère Général Soleil (1985) é contada a vida de Hilarion. Nascido na
miséria, sua infância faminta, seu olhar sagaz para a vida lhe permite captar
as palavras daqueles que entenderam antes de que é possível transformar a
sociedade e impedir, assim, tanto sofrimento.
A
essa história – de fome, roubo, prisão, trabalho,amor, conscientização política
e morte – se acrescentam outras, quase iguais e que delineiam o destino dos
negros do Haiti. Um Haiti que mostrado
na sua paisagem rural e urbana que se degrada, juntamente, com o povo faminto
Eu me entusiasmo! Eu me entusiasmo sempre
quando olho para meu país... exclama Jacques Stephen Alexis em meio à
narrativa. Porque se ele fala dos destinos dos homens, seu olhar não se
afasta da terra onde esses homens vivem.
E, como um poeta, lhe enaltece as
virtudes: e o sol, e o céu, e o mar, e o vento, e o verde, e os perfumes. Um
paraíso tropical e, nesse país de montanhas azuis, verdes, vermelhas, o fruto
da terra desabrocha: batatas, milho, arroz, tâmaras, figos, mangas, bananas,
pepinos, abacates, damascos.
Para
a maioria, para aqueles que batem os pés descalços no solo duro e seco, trabalhadores
que, incansavelmente, sempiternamente, desesperadamente correm e se inclinam sob os fardos ou se esforçam sobre máquinas, apenas um
pouco desses frutos é suficiente para acalmar a fome. No verão, bem baratos, os
abacates e os inhames permitem forrar o estômago das crianças. Logo, chegam os
damascos, depois as mangas amadurecem e as árvores se carregam de frutas
vermelhas e amarelas. Se as melhores e as mais cheirosas são levadas para os bairros ricos, sempre sobram as outras
para enganar a fome.
Porque
a generosidade da terra é bloqueada pelas estruturas sociais que oferecem a
alguns o supérfluo e a quase todos o mínimo imprescindível. Nesse paraíso
tropical, mais do que a cólera das tempestades, a queima das árvores para fazer
carvão e a erosão causada pelos ventos, são os homens que se atribuem poderes, os elementos mais daninhos.
Para
desmascará-los nos seus romances prenhes de verdades, por querer lutar em busca
da justiça social é que Jacques Stephen Alexis encontrou a morte sob a tortura.
Seu
romance Compère Général Soleil foi publicado pela Gallimard de Paris sob
a rubrica “L’ imaginaire”. Um país tão lindo como o Haiti e tão fértil e
habitado por homens depauperados e infelizes, certamente, parece destinado a só
existir num imaginário.
Mas,
aí está o mapa do Continente. Nele, a realidade dos frutos. E dos homens
famintos.


