Numa
obra que se espalhou pelo Continente (La
inquietud del rosal, El dulce daño,
Irremediablemente, Languidez, Ocre), ela cantou quando todas se calavam. Alfosina Storni, uma
poetisa que, sem medos, deixou que fluíssem de seus versos o amor. Um amor que
pode ser doloroso ao se esgotar em triunfos e tristezas de um viver feminino em
dasacordo com a sua época. E que não a deixa cega para o sofrimento que,
eventualmente, vislumbra em Buenos Aires: a miséria que sabe existir e contra a
qual se reconhece impotente.
O
amor a explodir no corpo de uma mulher
que se queria submissa (vou cair a
teus pés sob a lua cheia, sou um
lírio caído aos pés de uma montanha,
caio entre tuas mãos pequenas como pássaro), que se queria perfeita (deusa criada por Afrodite com as flores dos
bosques, mármore morno e palpitante ). Para assim,
submissa e perfeita, cumprir o eterno ritual feminino (banhei-me na fonte, perfumei-me as mãos, penteei meus cabelos e para
agradar-te me vestirei de branco) e realizar a entrega para a qual presume-se ter sido criado o ser feminino.
Uma
entrega ansiosa, feita de esperas e de perdas. Uma espera de lírio pisoteado,
de pássaro branco, de loba que irá culminar, ao atender o chamado do corpo,
naquele fazer-se mãe que os preconceitos repudiam. O que a fará dizer : o ventre
que se dá sem reticências / põe um sopro de Deus nos seu pecado . Loba entre as ovelhas temerosas, pobrezinhas
e mansas ovelhas do rebanho, procura o oásis, o descanso, a paz do homem
amado: buscarei teu peito para aninhar
este peso enorme que levo na alma.
Entre
os amores que passam, que morrem, que enganam vai- se enredando o desprezo que
sente por certos homens, por certas leis que a encarceram: o homem que a exige
pura, intacta quando, há muito, ele deixou de sê-lo. As leis que regem o
relacionamento amoroso dos bem pensantes. Entre a indignação diante dos olhares
e risos que acompanham o seu caminho e o anseio do amor e de amar, ela se
divide, se constrói ou se descobre um ser
hesitante que ora se mostra fera, ora um sutil e leve ser alado. Porém,
sempre, uma certeza. Dessa certeza, a voz que se levanta fala de angústias, de
solidão, dos momentos plenos que tanto podem significar um grande amor pela
vida, como o êxtase originado de uma carícia ou o sentimento que a faz
sustentar no seu ombro a cabeça adormecida do velho que viajava a seu lado no
bonde.
E’um
sentir que ampliado de seu mundo para o mundo dos outros, irá dar matizes e poemas
que inscreverão Alfonsina Storni entre os poetas que não apenas são capazes de criar a beleza mas,
também, de enunciar conceitos capazes de levar à transformações.
Homem pequenino / Estive na gaiola, homem
pequenino / Homem pequenino, gaiola me dás / Digo pequenino porque não me entendes / Nem me entenderás. / Tampouco
te entendo, mas enquanto isso / Abre-me a gaiola que desejo escapar; / Homem
pequenino, te amei meia hora, / não me peças mais.

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