domingo, 26 de julho de 1987

Sobre quatro cartas de Pablo Neruda

            Momentos vividos intensamente. Relatos de viagens, prólogos, discursos, poemas em prosa, testemunho sobre homens de seu tempo, reflexões, cartas. Entre 1922 e 1973, Pablo Neruda vai completando, desalinhavadamente ( como ele diz), suas intermitentes lembranças que foram recolhidas por sua mulher, Matilde Urrutia e por Miguel Otero Silva, escritor venezuelano  e publicadas em Para nacer he nacido (Seix Barral, Barcelona, 1978).

            As cartas, como os demais textos do livro, em número de quatro se originaram de diferentes razões e foram escritas em diferentes épocas: uma, em 1958, duas no ano seguinte e a última, em 1973.

            Irônica, incisiva, a carta que escreveu ao Presidente do Chile, Don Carlos Ibañez del Campo, no momento em que lhe era negado, como também a outros chilenos, o direito de voto. Um direito, no seu dizer, que possuíam os piores delinqüentes do país ou o seus mais hábeis exploradores. Argumenta sobre o absurdo de ter sido recebido e honrado por tantos países europeus, merecido prêmios internacionais, ter  os seus livros traduzidos em muitíssimos idiomas, fazendo, com isso, brilhar o nome de seu país e não ter o direito de votar para escolher seus dirigentes.

            Ao Presidente do México, Dias Ordaz, começa a sua carta dizendo : Me escriben  que José Revueltas, el novelista, está preso em su patria, México. Fala, com  muito carinho e admiração sobre  o compositor Silvestre Revueltas e a atriz Rosaura Revueltas irmãos do romancista, autor de uma vasta obra caracterizada pelo realismo crítico e a luta pela justiça social. E pede por sua liberdade porque, sem dúvida, é inocente mas, sobretudo porque lo queremos muchísimo.

            Em 1959, escreve ao Presidente da Academia Estadunidense de Artes e Letras para agradecer a honra de ter sido eleito sócio, compreendendo  que a homenagem se estende, também a seus conterrâneos.  No entanto, explica estar unido aos intelectuais norte-americanos contra a guerra do Vietnã e que nessas condições não poderia aceitar a distinção que lhe é outorgada das mãos de um embaixador dos Estados Unidos,  tampouco em lugares que representem o governo.

            No dia 31 de agosto de 1973, vinte  e quatro dias antes de sua morte, escreve uma carta de adesão ao General Carlos Prats que renunciou nas vésperas do golpe militar  contra Salvador Allende. Nela, fala do “empenho cego” daqueles que, mesmo a custa de uma guerra fratricida não cultivam outro interesse que o da conservação de seus próprios privilégios.

            São cartas que possuem em comum o amor que Pablo Neruda sempre expressou pelos seres humanos, pela natureza, pelos objetos. E, se constituem um valioso material para auxiliar na compreensão do homem e do poeta. Nelas, Pablo Neruda reafirma os conceitos e posições ideológicas que nortearam a sua vida cheia de sonhos sobre o porvir do homem latino-americano e da certeza sobre a função da poesia na construção do Continente.

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