Em Porto Alegre, desce do bonde e, por a
caso, ao entrar num armazém de fim de linha, para a compra de cigarros, aceita
o convite de quatro rapazes que lá estavam e segue junto com eles para a praia,
no passeio que deveria durar um dia e
que para ele e para Norberto, acabou resultando num tempo bem maior em que
acontecimentos foram surgindo e os levaram até o Rio de Janeiro de onde ele
volta para o lugar de sua infância, às margens do Cati, no extremo sul do Rio
Grande.
Lembrando
Oscar Tacca no seu imprescindível Las
voces de la novela (Madrid, Gredos, 1973), a função do narrador é informar
e nela não está permitido falsidade, nem dúvida, nem
interrogação. Apenas lhe é dado poder variar a quantidade de informação que
oferece. Em O Louco do Cati, ( Porto Alegre, Globo, 1944 e recente edição da Planeta) o narrador está fora dos
acontecimentos e refere os fatos, na terceira pessoa, sem fazer alusão a si
mesmo. No entanto, é constante sua presença, revelada nas explicações que
aparecem, entre parênteses, em que acrescenta algo sobre os personagens, o
cenário, um ou outro sucesso, ou tempo, introduzindo um elemento coloquial que
o aproxima de um provável, eventual interlocutor. A palavra tempo aparece se
referindo à condições meteorológicas: o
navio jogava muito ( o tempo ficara feio);
O calor não podia-se manter por muito
tempo (já se estava quase no outono).
Quando vários personagens precisavam seguir viagem aquele tempo louco os atrapalhava: (Parecia
até, pelo jeito com que se reclamava a decifração
meteorológica, que era um corretivo que se queria infligir ao tempo). Em
outros momentos, aparece, entre parênteses, a satisfação
de todos: ( O vento que fazia e que todos já suportavam com satisfação porque viria
limpar o tempo). Muitas vezes, a referência ao tempo completa um cenário,
remete a uma ação. Referindo-se o
narrador à tonalidade verde-vinho da parede e dos móveis da casa de dona
Josefina que ficava mais nítida com a luz do dia, acrescenta, entre parênteses (embora um dia sombrio). Numa seqüência a hora é mencionada com exatidão, às quatro da tarde e o que se segue,
entre parênteses esclarece sobre as condições meteorológicas ( quando o tempo se fizera melhor e até o
vento cessara); noutra,
igualmente, a hora é mencionada – inclusive duas vezes – e a imprecisão é introduzida
na frase, entre parênteses ( Às sete
horas da manhã (viajavam desde a véspera à noitinha), às sete horas tinham sido levados ao refeitório [...].
Essa
menção ao tempo, condição meteorológica
ou sucessão de horas e dias, não somente é uma constante em O Louco do Cati como, repetidamente, se
constitui o aporte do narrador de um dado que ele julga pertinente, ainda que o encerre entre
parênteses e ao qual dá um sentido esclarecedor, embora diluído na
imprecisão. Um recurso de Dyonélio Machado que se faz presente muitas vezes – com habilidade pontilha sua narrativa de
lacunas e nuanças – e se ampara, engenhosamente, no seu direito de ofertar ou
recusar informações.
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