Amalia é o primeiro romance
argentino. Foi
escrito
em 1851, na cidade de Montevidéu, onde
José
Mármol, seu autor, se refugiara da ditadura de
Manuel
Rosas.
No
relato desse trágico amor, pretexto para documentar a vida em Buenos Aires sob
a tirania de Juan Manuel Rosas, estão presentes todos os artifícios românticos:
lágrimas, agouros, juras, tristezas, religiosidade, perfeições maniqueístas. E
a obrigatoriedade de se curvar à natureza o que significa, nesse romance de
José Mármol, o referir-se, umas poucas vezes, ao amanhecer ou ao anoitecer,
momentos cambiantes que ele, como poeta dos versos profusamente líricos de Armonías, fixa com expressões exuberantes que, mais do que nada,
servem para definir o que se passa na infeliz Buenos Aires. Para ele, uma
cidade em que a luz do sol não serve senão para tornar mais visível a lôbrega e terrível noite de sua vida, sob cujas sombras
se revolviam em caos, as esperanças e o desengano, a virtude e o crime, o sofrimento e o desespero. Opondo-se a
essas trevas determinadas pelo tirano, ao silêncio sepulcral da cidade, longe,
no horizonte, uma vida pujante a desabrochar. Breve pausa na narrativa, as
referências que se sucedem a delinear a alegria, emergindo do relinchar dos
potros selvagens na solidão do pampa, da correria dos touros em busca da água
gelada dos arroios, do saltar dos pássaros nas copas das árvores, do abrir das
pétalas coloridas em meio ao trevo dos campos. Momento luminoso em Amalia, perfeitamente claro na sua
intenção de mostrar mais sombria e cruel a atmosfera reinante em Buenos Aires
nesse repetir de misérias e humilhações que viviam os opositores de Rosas.
Porque
foi essa a intenção de José Mármol. E o ideário romântico do qual se serviu,
vigente na época em que escreveu o seu romance, foi-lhe precioso na medida em
que lhe permitiu criar personagens convictos de seus ideais patrióticos,
servir-se de uma linguagem grandiloqüente, comprometida com suas razões e
tratar a natureza como algo relacionado ao mundo que deseja retratar. Assim, em
Amalia, ela não estará em acorde ou
em discrepância com o sentir dos homens como indivíduo, o que é usual nas obras
românticas, mas com o que se passa na cidade onde impera a tirania e com os
homens a esta tirania submetidos: A
primavera começava para a Natureza. Mas, ai!,o âmbar da flor ia se extinguir entre o cheiro de sangue. O campo ia perder
seu manto de esmeralda com as manchas de sangue que nem o passar dos anos
apagaria. O arroio ia levar sangue na
sua corrente. A luz do dia a se envolver entre o vapor de sangue. E os astros
que mancham o manto celeste de Deus, iam
quebrar seu tênue raio sobre os charcos de sangue.
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