No dia 12 de abril de 1975, o “Caderno de
Sábado” do Correio do Povo, de Porto
Alegre, publicou o soneto LXXVII de Mário Quintana. Parte do “Caderno H” se
constitui aquele soneto renovado que deixa para trás a sisudez para dizer,
alegre, de um momento presente de euforia.
Como
tantas vezes nos poemas de Mário Quintana, esse tom coloquial, narrativo, do
primeiro verso: O outono de azulejo e
porcelana chegou!, parecendo diluir o que a expressão tem de inesperada na
relação que estabelece entre estação do
ano e o objeto. Logo, outra expressão cotidiana Minha janela, introduzindo a metáfora é um céu aberto. Depois, o falar sobre a felicidade, o luminoso do
dia, o traço descritivo da paisagem e a interpelação a um interlocutor próximo:
Tuas tristezas... o que é feito delas?
Mas, a esse interlocutor, não é dada ocasião de resposta pois, de imediato, ela
fica por conta do poeta: Tombaram como
folhas amarelas / sobre os tanques
azuis.
A
escolha do verbo tombar em lugar de cair, as cores, a comparação, a idéia de algo que mudou
(contida na expressão folhas amarelas)
e de algo, talvez, imutável (tanques
azuis) fazem versos plenos de clara sugestão que, de repente, se opõem às
palavras que seguem: que desaponto que irão rimar com as últimas do soneto Pronto. Ambas são de extrema simplicidade do falar comum,
contrárias ao verso cuidado mas em consonância com cartaz, adiados os suicídios, simplesmente.
E
o outono é, na verdade, motivo para falar de Porto Alegre. Para o poeta, a
única cidade a oferecer um estado de
graça cotidiano onde tudo transluz,
onde a tristeza é negada porque é abril em Porto Alegre. Motivo,
sobretudo, para falar de um espaço interior, em festa, apto a perceber a beleza da paisagem, a atmosfera da cidade que
leva a repudiar tristezas.
Despretensioso
decassílabo, o soneto LXXVII não buscou
rimas ricas, nem palavras sonoras, nem imagens inigualáveis, nem um tema
grandiloquente. Apenas se ancorou na emoção de um dia de luz – o outono na
cidade, a felicidade de viver – na expressão espontânea de um dizer de todos os
dias. Inserida nessa simplicidade, a faísca própria dos grandes poetas.

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