domingo, 19 de janeiro de 1997

Entre um mate e outro


Todos disputam direitos,
mas, amigo, sabe Deus
se conhecem seus deveres
...
Que direitos nem que diabos!
Primeiro é a obrigação;
cada um cumpra com a sua
e depois será a razão
que reclame seus direitos.
              Bartolomé Hidalgo
 

            A poesia gauchesca surge com o “cielito” (quarteto com rima assonante, seguido de um estribilho no qual sempre aparece a palavra “cielito”) de Bartolomé Hidalgo, nascido em Montevidéu em 1788.

            Compreendendo ser a linguagem típica dos pajadores, o veículo de comunicação entre aqueles que aspiravam conquistar a liberdade política, ele se valeu dessa linguagem para protestar contra a tirania dos invasores, no caso, os espanhóis na América, e para exaltar o amor pela pátria em formação.

            Entre suas composições diz Domingo A. Caillava na História de La Literatura gauchesca en el Uruguay (Montevidéu, 1945), - odes dramáticas, hinos, epitalâmios, romances – aquela que lhe deu renome e celebridade foi o “diálogo”, gênero muito apreciado na época.

            São três os diálogos de sua autoria: “Diálogo patriótico interesante entre Jacinto Chano, capataz de una estancia en las Islas del Tordillo y el gaucho de la guardia del Monte”, “Nuevo diálogo patriótico entre Ramón Contreras, gaucho de la guardia del Monte y el capataz de una estancia en las Islas del Tordillo” e “Relación que hace el gaucho Ramón Contreras a Jacinto Chano, de todo lo que vió en las fiestas mayas de Buenos Aires en 1822”.

            Esses diálogos são poemas narrativos onde a estrutura é sempre a mesma: eles se iniciam com o encontro dos interlocutores (um vem de visita ao outro), o convite para apear do cavalo, o oferecimento do chimarrão, o contar das notícias sobre acontecimentos políticos, o expressar de opiniões.

            Os interlocutores se exibem, então, como gaúchos patriotas que, na sinceridade das assertivas, se mostram tal como são nesse linguajar popular e rico de figuras em que se expressam.

            E o diálogo que se instala manso se transforma e diz dos anseios de igualdade e dos anseios de liberdade que os homens que lutam presumem devam ser para todos. Dizem das preferências dadas aos aduladores, dos gastos públicos, enquanto as estradas permanecem intransitáveis e os edifícios inconclusos e os pensionistas do Estado morrendo de fome.

            Incongruências que fazem desse presente em que viviam, algo não somente para lamentar como para levar ao surgimento desse patético desejo de corrigir, de melhorar, de vislumbrar um futuro.

            Então, no cenário simples e brando das campanhas do sul do Continente, combativo e forte há um cantar verdades.

            Entre um mate e outro.

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