Em 1973, foi
publicado pela Noguer de Barcelona; El
Hombre que trasladaba las ciudades de Carlos Droguett. Faz parte do que a
historiadora francesa Jaqueline Covo chamou, a respeito de sua obra, a trilogia
da conquista: romances que refazem na ficção a crônica oficial desse
adentrar-se dos espanhóis em terras da América, no século XVI. No seu quarto e
último capítulo é narrada a chegada do capitão Francisco de Aguirre à cidade de
Barco, seu encontro com o governador da cidade, Juan Nuñez de Prado que é,
então desterrado.
Alain Sicard, professor da
Universidade de Poitiers, França, no Colóquio que essa Universidade realizou em
maio de 1982, sobre a obra de Carlos Droguett, ao falar sobre a paixão da escrita que sempre dominou o
escritor chileno, o define como um apaixonado
louco pelas sinuosidades do idioma.Afirmativa que, sem dúvida, é
exata e pertinente para definir o autor de uma expressão lingüística que faz de
El hombre que trasladaba las ciudades
uma das mais belas e perfeitas obras escritas neste século e cuja riqueza
formal, emergindo de cada um dos recursos, ainda que o mais simples e
despretensioso, como o uso da comparação, é imenso.
Nas quarenta e quatro
páginas que compõem o quarto, último e o mais breve capítulo do romance, elas
se destacam, sobretudo, pelo inusitado da composição. As comparações que se
referem à qualidades ou à ações, como as citadas por Wolfgang Kayser na sua obra
Interpretación y análisis de la obra
literaria, no romance de Carlos Droguett, por vezes, são bastante breves : clara e delgada como uma
facada, cavalo inteiramente seco, penteado e lustroso como se o houvessem fabricado para ele. Na verdade, sobressaem aquelas
de forma detalhadas, lembrando as comparações épicas, próprias dos longos
poemas clássicos. É o caso desta, em que o elemento real, as carretas, se
confronta com vários elementos imaginários, ainda que seja possível se tornarem
realidade: foi caminhando apressado,
olhando com dissimulação as carretas, com duvidoso e vago desassossego, como se
estivessem cheias de ameaças visíveis e prováveis, de índios pérfidos, de sujos
traidores que surgiriam sigilosos delas, de qualquer noite, quando tivesse se
pacificado o medo, a solidão, o silêncio que haviam deixado na cidade a prisão
e o destino de Juan Nuñez de Prado.
De maneira dispar, se
constrói a comparação em que um elemento, respiração,
é confrontado com: fumaça da terra, perfumes, plantas, flores, raízes ao qual se acrescenta, ainda, uma condição circunstancial: raízes quando vem rompendo alegres ou
pesarosos os torrões e empurrando as pedras porque amanhã, dentro de três dias,
será primavera.
Em outro caso, o primeiro
elemento algo indefinido, coisas concretas,
se confronta, três vezes, sempre introduzido pela palavra como com dois elementos objetivos, reais (carne, sangue)
significando corpo e outro elemento abstrato, significando sofrimento. Nessas três vezes, a expressão por exemplo reafirma o coloquial do texto, um fluir da consciência
do padre Carvajal ao ser amarrado e golpeado pelos soldados do capitão
Francisco de Aguirre que chegou na cidade para exercer a justiça: coisas concretas como tua carne, por
exemplo, como teu sangue, por exemplo, como teu sofrimento, por exemplo.
Verdadeiramente diluídas no
texto de El hombre que trasladaba las
ciudades, essas comparações não se constituem a marca primeira da escrita
de Carlos Droguett. No entanto, em acorde com o todo ao qual pertencem, são
prova de uma capacidade inventiva que se alimenta do denso e do afetivo porque
nesse escrever da História da América é do homem e de seu trágico destino no
Continente que o escritor chileno está a falar.

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