domingo, 18 de fevereiro de 1996

Vassalagem

          “A Literatura como consciência do Povo” faz parte de uma coletânea – entrevistas, reflexões dispersas e um romance inédito – preparada pela professora Maria Zenilda Grawunder, de Porto Alegre, cuja publicação pela Graphia do Rio de Janeiro é de 1955: O cheiro da coisa viva.

          O texto data de 1977, quando o escritor gaúcho respondeu a um questionário sobre cultura brasileira, solicitado por Escrita, uma publicação paulista.

          Aparentemente, Dyonélio Machado se submete ao balizamento das perguntas e discute alguns temas – a cooptação dos intelectuais pelo Poder, a relação entre cultura e classes sociais, o imperialismo na reflexão sobre a cultura – que, evidentemente são, sempre, inesgotáveis. Sobretudo para quem já muito vivera – Dyonélio Machado tinha, então, 82 anos – e sem deixar de perceber o que acontecia no país.

          Assim, ainda que pretendendo se ater às perguntas formuladas, muitas outras observações se acrescentam às respostas, enriquecendo-as numa contribuição efetivamente ampla e perspicaz.

          Dyonélio Machado defende a correção e a pureza do idioma, comprometido pelo tipo de autor que ele chama de reivindicador iconoclasta. O que atropela a pontuação, a sintaxe, o significado, a grafia numa rebeldia sistemática que, alheia a qualquer apreciação dialética, busca apenas a originalidade e expressa, então, simplesmente, o vazio e o mau gosto.

          Observação que, é óbvio, se entrelaça com a que diz respeito aos estrangeirismos oriundos, já nessa época, somente da “poderosa nação do norte” cuja língua exerce tanto fascínio quanto seus costumes, suas mercadorias, seus objetos de uso cotidiano que se derramam sobre nós, como uma ganga mineral, resíduo praticamente inaproveitável, devido a uma impossibilidade intrínseca de integração.

          Daí o êxtase que alimenta grande parte da população brasileira por tudo aquilo que procede dessa Meca da atualidade, desse centro continental da tecnologia que é preciso conhecer e se possível imitar, desse país das benesses.

          Sabiamente, Dyonélio Machado esperou (ou almejou) que o tempo dialeticamente levasse os brasileiros a negarem a repetição, a redundância vinculadas a essa desastrosa submissão.

          Vinte anos passados, poder-se-ia, também almejar que pudessem se tornar conscientes do que verdadeiramente representa o imperialismo cultural.

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