domingo, 11 de fevereiro de 1996

Embates


Nós trabalhamos mil anos a terra antes  que chegassem os agrimensores e os advogados e o exército para dizer: a terra já não é de vocês, a terra já foi subastada, mas fiquem aqui para continuar vivendo, servindo os novos donos ou do contrário morram todos  de fome. Carlos Fuentes. 
 
          Os caminhos deles se cruzaram quando buscavam a morte, a dignidade ou somente um lugar no mundo: o gringo velho procurou o México para morrer e Harriet Winslow para ali viver de seu trabalho. Tomás Arroyo queria, apenas, o direito de viver livre na terra que lhe pertencia. Foram surpreendidos por profundos afetos. Um intermezzo de vida no sombrio destino de cada um.

          São belos e ricos personagens que o romancista conduz mergulhados em aventuras da alma no espaço de um Continente conturbado por uma luta em que os homens perseguem o direito muito simples: o de poder existir como homens e não como escravos.

          Carlos Fuentes, em Gringo viejo (Tierra Firme, 1986) fala de paixões, fala da violência dos embates; dos homens que acreditam na transformação do mundo em que vivem onde impera, sobretudo, a injustiça e a opressão.        Mas, também fala da terra, tornando-a presente em brevíssimas expressões que, inseridas na narrativa, completam, aos poucos, um quadro de aparência tão agreste e rude quanto os homens que a habitam.

          E as regiões desérticas, habitadas por cobras e escorpiões, onde a vegetação se ergue afiada e nervosa, onde espinhos protegem a beleza de uma flor selvagem, está em acorde com esses homens cuja história foi feita de fugas, de negações, de um querer se preservar: expedições em busca do ouro, tribos errantes e moribundas, movimento perpétuo de fundações e dissoluções, bonanças e depressões, genocídios tão gigantescos como a terra e tão esquecidos como o rancor acumulado dos homens.
          Um romance em que as histórias de medo, de amores e de desenganos conduzem palavras e idéias.
          O velho norte-americano morre na morte que foi procurar no México; a mulher que atravessara a fronteira para ensinar, apreendeu o mais profundo da vida. E, vítima de uma vontade inventada, cai, baleado, o general mexicano.
          Além da paisagem esboçada em tintas de um quadro acabado e perfeito, além do momento em que se incrustaram as paixões, é um narrar que faz emergir também, os sentidos do Continente.
          Sentidos que a maioria mal sabe entender ou explicar. E que os outros, os espoliadores, transformam naqueles que lhes proporcionam os ilimitados privilégios.

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