E’na
Universidade de Poitiers, a 340 quilômetros de Paris, que se inscreve um dos
mais prestigiosos centros de estudos sobre literatura latino-americana. Em
1981, continuação de um programa que já havia sido dedicado a Pablo Neruda,
Juan Carlos Onetti, Augusto Roa Bastos, César Vallejo, Graciliano Ramos e
Machado de Assis, foi realizado um Colóquio Internacional sobre a obra de Carlos
Droguett.
Extremamente
importante pelo número e pelo nível dos trabalhos apresentados e pela
documentação sobre o autor, presente ao evento, realizada em vídeo,
representou, sobretudo, a partir de uma presença efetiva na Universidade
francesa, um marco para a história literária do romancista chileno no que se
refere ao que a Literatura Comparada chama “fortuna” de uma obra.
Na verdade, um acréscimo pois
textos de Carlos Droguett há muitos anos, já haviam chegado na França. Seus
primeiros contos que passaram despercebidos no Chile como, de certo modo e
durante muito tempo, todos os seus romances, foram traduzidos por Francis de
Miomandre que os considerava admiráveis e os publicou em revistas literárias
francesas.
Mais
tarde, em 1977, foi a vez de Eloy,
romance publicado na Espanha antes de sê-lo no Chile, ser traduzido para o
francês e publicado pela Maspero. E, em 1983, pela Denoël, numa tradução
verdadeiramente brilhante de Jean Marc Pelorson, apareceu Patas de perro.
E, anunciada para breve, a tradução de El Compadre.
Até
certo ponto, seguindo os passos dessa
trajetória da obra de Carlos Droguett no circuito comercial francês e, logo o
acompanhando, a crítica universitária se faz presente. Em 1980, Ana Maria
Díaz-Moreno defendeu uma tese sobre Eloy e, agora, bem recentemente ( o
trabalho não trás data), uma nova tese é defendida, desta vez sobre Patas de
perro, romance considerado por muitos como a obra-prima de Carlos Droguett:
Une étude de la marginalité dans Patas de perro, de Carlos Droguett. Seu
autor, Jean Paul Audoin, se debruça sobre a marginalidade de Bobi, o personagem
principal do romance, num mundo hostil em que prevalecem as normas e as leis.
Procura mostrar como a marginalidade é
ligada à sociedade da qual o marginal procura fugir e como essa sociedade está
na origem do processo de marginalização e com as conseqüências que lhe são
inerentes. Antecedido por
um estudo sobre a gênese da história, sobre a solidão que alimenta os dois
personagens principais e sobre as buscas de Bobi, uma orientada para a
religião, outra para a política, “Escrita e marginalidade” a quarta parta do
trabalho se detém em dois aspectos que são de suma importância na obra de
Carlos Droguett: o procurar transgredir as normas vigentes na construção do
romance e o oferecer um universo romanesco fragmentado através de explosões de
palavras que, aparentemente, podem parecer caóticas. Sobretudo, porque nem
sempre, os tempos verbais se justapõem e as frases começam onde parecem estar
terminando. Este contrariar da lógica, diz
Jean Paul Audoin, permite reviver do interior do personagem este fluxo de
paixões que nascem e desmaiam, que são gravadas e apagadas. Assim, as
impressões criadas são mais próximas de
uma verdade emocional do que qualquer outra escrita em que os esquemas estejam
previstos de antemão. Uma desordem que, de certa maneira, se inscreve na
natureza e na sociedade: desordem de idéias e de sentimentos que, no entanto,
frisa o estudioso francês, são o suporte dessa sociedade normalizada e
intolerante. Razão de sobra para que nela existam os oprimidos, os
marginalizados.
E’por
eles que o romancista chileno escreve. Em Patas de perro como o
demonstrou Jean Paul Adouin, ele modelou a escrita à imagem do seu personagem:
marginais ambos. Na sua concepção revolucionária do mundo – de um mundo que ele
anseia diferente – a rigidez da escrita deve ser quebrada como devem ser
quebrados os laços que aprisionam o homem. E, Jean Paul Adouin cita as palavras
que, em 1981, Carlos Droguett pronunciou em Poitiers: ser marginal significa ser
livre.
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