Trinta
e oito artigos formam o livro cuja introdução “José Maria Árguedas,
transculturador”, assinada pelo crítico uruguaio, permite, não somente, situá-los no conjunto
da obra de José Maria Árguedas mas, sobretudo, compreendê-los como
representação de um pensamento profundamente e unicamente comprometido com uma
América para aqueles que foram, desde sempre, os seus donos, embora alijados da
terra e de seus valores pelos que aqui chegaram e usurparam.
No
entender de Angel Rama, o que distingue o escritor peruano daqueles que se
serviram da temática indígena para construir sua ficção é o enfoque do qual ele parte: a cosmovisão
das comunidades indígenas e não a visão do branco sobre elas.
Em
seus ensaios sobre Antropologia e Folclore que formam Senõres e indios, as
expressivas descrições de festas, ritos, cerimônias, danças, cantos, de
profundo valor documental evidenciam, sempre, o drama de uma comunidade que,
desde 1592, resiste à invasão da cultura
dos invasores.
Comoventes
são todas essas imagens da vida andina que José Maria Árguedas fixou. Como
intelectual, ele busca a exatidão; como um homem extremamente sensível, percebe
essa dualidade estabelecida nas manifestações culturais e religiosas que, na
verdade, expressa o processo de destruição dos valores de todo um povo.
Na
festa de Tina, um povoado silencioso de
ruas estreitas, os homens solteiros saem para passear tocando flauta,
vestidos com grande elegância, caminham, orgulhosamente, na praça. As índias solteiras se vestem ricamente. José
Maria Árguedas lhes descreve, com minúcia, a beleza dos trajes indígenas e
nobres. Constata que os homens, apesar de seu
orgulho, de sua altivez desdenhosa, levam nos sapatos de futebol e nos cintos
de couro, a feia marca do traje híbrido e desalinhado do mestiço.
Talvez
no desejo de esquecer essa visão melancólica é que o seu olhar se volta para a paisagem:
sob a ponte de Tinta passam as águas do Vilcanota, silenciosas e
transparentes.
Como que um
irreal caminho ainda não conspurcado.

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