Poderia
ser o roteiro de uma seqüência de filme americano pela violência e fria
precisão com que um dos personagens persegue e elimina o outro.
O
cenário é uma orla marítima. A praia deserta, as dunas, depois a floresta. O
barquinho a remo que no cenário se inscreve, tem, no seu bojo, um ser gordo e
inexperiente. Vestido de branco, ele
rema com ineficácia, é atirado na praia pelo acaso das ondas e tenta alcançar
as dunas, sua meta e salvação. Qualquer de seus gestos são mal esboçados e
parece que se move, somente, porque a
isso é induzido pelo barco que lhe vem ao encalço, na busca de um confronto.
De
um personagem, apenas se sabe que é fugitivo, que não sabe nadar e nem usar um revólver e que, por obeso, não pode
correr. O ser gordo, desajeitado, medroso e careca fazem dele o vilão ainda que
esteja indefeso diante do outro.
O
perseguidor é calmo, domina as ondas através do remar dos negros que lhe cumprem as ordens e do
rumo do barco. Sua voz é diáfana e seus cabelos, loiros. Sabe que não perderá a
presa e espera o momento propício para atirar. Chama-se Van Guld.
O
conto tem por título “En la playa”. O livro no qual foi publicado, Narda o
el verano. Salvador Elizondo é o
autor. Mexicano, nascido em 1932, começou a publicar em 1960: Farabeuf o
la crónica de un instante que recebeu o prêmio Villaruttias e ao qual se
seguiram El hjipogeu secreto, El retrato de Zoe y otras mentiras,
Cuaderno de escritura e El grafógrafo. Na Literatura Mexicana
ocupa, no dizer de alguns críticos, um lugar ímpar na medida em que nenhum
antecedente na Literatura de seu país explica seus textos.
“
En la Playaӎ o segundo dos textos que formam o livro e o melhor deles para o
leitor que procura, na ficção, o
postulado que Alejo tão bem sintetizou: a
função definitiva do romance consiste em violar constantemente o princípio ingênuo de ser um relato destinado a causar prazer estético ao
leitor para se tornar um instrumento de indagação, um modo de conhecimento dos
homens e de sua época. Porque
Salvador Elizondo é, sobretudo, um autor de signos, de composição pura, do
abstrato e dos jogos de linguagem.
A
leitura de “En la playa” lembra algum texto do “nouveau roman” francês. O
narrador descreve apenas o que vê e nada mais do que isso saberá o leitor. Nem
a identidade dos personagens, nem o motivo da perseguição ou o que vai ser
desse cadáver que ficou jogado na areia; ou qual o destino do executor que não
teme o testemunho dos negros que remam o seu barco e que atira com arma de
matar elefante. Preciso, claro, autoritário, afasta-se pelo caminho que veio.
Chama-se Van Guld e tem cabelos loiros.
Certamente,
por ter sido sempre aceitos como bons e
justos os seres de raça branca, essas informações orientam simpatias numa
experiência trocista do exercício lúdico que tantas vezes se inscreve no texto
de Salvador Elizondo.O cadáver do gordo abandonado ao sol carece de importância
diante do homem que se afasta do lugar do crime. Como se os cabelos loiros ao
vento tivesse feito dele não um assassino mas um justiceiro.

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