Um
pequeno livro, formado de oito breves contos que, numa linguagem
expressivamente cotidiana, narra as aspirações medíocres de uma classe média
dominada por preconceitos e submissões. Tem por título El diablo son las
cosas ( Letras Cubanas, 1988) e sua autora é Mirta Yánez, nascida em La
Habana em 1947. Entre esse
último livro e o primeiro, Las visitas (1970), medeiam Todos los negros
tomamos café, Valoración múltiple sobre la novela romántica en Latinoamérica,
Serafin y su aventura con los caballitos, La Habana es una ciudad
bien grande, La hora de los mameyes.
Em
El diablo son las cosas, aparecem encontros e desencontros de gerações,
destinos que a vida truncou, indignações
e entusiasmos. Um riso bem humorado ou melancólico ou um ligeiro amargor marcam
cada página de um livro dominado por figuras femininas. que se movem numa
paisagem urbana e se desvendam, sobretudo, em espaços interiores.
Três
mulheres velhas e celibatárias, ligadas por extrema amizade até que a morte de
uma delas revele sentimentos ignorados; a viúva Beti, na solidão em que vive,
se inscreve, ainda, a mágoa de matar por acaso o camundongo que morava na sua
cozinha; a mãe de uma adolescente, enfrentando diálogos difíceis no melhor
estilo da luta de gerações; a solteirona de má sorte em busca de sorte melhor.
E as meninas.
Cristina,
personagem de “Ópera prima”. Quase criança, está em Moscou para competir. Desde
que se levantava sem ajuda e sem apoio no chiqueirinho, o pai selara o seu
destino: seria campeã de ginástica olímpica. E por esse objetivo, lhe tirou a
infância, passada sem sorvete,nem doces, nem amiguinhos, nem televisão para que
todas as suas energias fossem voltadas para o treino. Porém, em Moscou, algo
acontece. Cristina obtém excelente nota e, também, a convicção de que, para ser
merecedora da medalha de ouro, algo lhe falta. Prefere desistir, ainda que isto
seja difícil no difícil momento em que descobre sua inesperada adolescência.
A
moeda do búfalo ficara esquecida no fundo da gaveta. A luta pela vida e os
sucessos alcançados se superpuseram aos sonhos da infância. Doutora em
Ciências, chefe de um departamento técnico científico, moradora de uma grande
casa num bairro rico, esteve num conclave cientifico no Canadá e não visitou as
cataratas; esteve em Paris e se esqueceu da água furtada de Jean Christophe; em
Leningrado não teve tempo para ver o Palácio de Inverno; na praça de São Marcos
se preocupou mais em cuidar do vestido novo do que dar migalhas aos pombos.
Nessas
e nas outras histórias, aqui e ali,
alfinetadas risonhas que atingem idiossincrasias, crenças, estados de espírito.
Aqueles que se espelham entre os sonhos infantis de Cristina e da narradora de
“El búfalo ciego” e que, de algum modo, questionam o relacionamento da infância
com o mundo dos adultos, podem levar ao enternecimento. Mais do que isso, porém
a pensar como e de que forma, o mundo adulto modela o ser humano. E nem sempre,
é preciso dizer, o faz para melhor.
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