Se
considerarmos que as edições críticas, as biografias insuspeitas, a crítica
descolonizada, a História Literária, pelo menos, na grande maioria dos países
latino-americanos, ainda estão para ser feita, torna-se compreensível o
desconhecimento que impera no Continente a respeito da produção literária que ocorre nos seus diferentes países fora
daqueles títulos autores “lançados” nos
grandes centros irradiadores ( ou assim considerados) de cultura.
Assim,
é por vezes, surpreendente, o aparecimento no Brasil de certas obras
latino-americanas sem a chancela de
encabeçar lista dos mais vendidos nas capitais estrangeiras como é o
caso da publicação de Doña Bárbara do
venezuelana Rômulo Gallegos, pela extinta Editora Guairá de Curitiba há alguns
anos atrás.
Em
1929, Doña Bárbara foi editado em Barcelona. O romance, escrito durante a
ditadura de Juan Vicente Gómez, é título importante, como o testemunham suas
numerosas edições e traduções, entre as demais obras de Rômulo Gallegos: Canaima,
La vorágine, Pobre negro, La trepadoara,
Cantaclaro.
Dois anos depois,
apareceu em inglês o quê, juntamente
com a “impressão de grandeza humana” que a leitura do livro lhe deixou, decidiu
Jorge Amado a traduzi-la para a Editora Guairá que o publicou numa edição sem data.
Em
1974, Doña bárbara teve uma nova edição, desta vez pela
Editora Record do Rio de Janeiro e, ainda, na tradução de Jorge Amado. Nestas
duas edições é digna de nota a intenção da Editora Guairá de publicar uma
coleção de ficcionistas latino-americanos muito antes do sucesso de algumas
obras latino-americanas que atingiram
aquele status internacional conhecido e a publicação de um clássico latino-americano agora, mais recentemente,
pela Editora Record.
Para
a edição da Editora Guairá, foi decisiva a indicação do livro por Jorge Amado. Na nota introdutória a
sua tradução diz que, em 1937, já ouvira falar desse romance por seus amigos
que afirmavam ser Rômulo Gallegos um romancista
de grande força criadora, poderoso
autor.
Hoje,
porém, quando o posicionamento dos escritores se mostra claramente adverso ao
statu quo da situação político social de
seus países e à importação de esquemas literários que pouco tem a ver com a
realidade latino-americana, tanto Rômulo Gallegos cuja carreira política vai
culminar na presidência do país, como sua obra,
elaborada, ainda, sob moldes europeus, são motivo de controvérsia.
No
entanto, Rómulo Gallegos refletiu sobre determinados aspectos da vida de seu
país, a Venezuela, que são aplicáveis a
todo o Continente latino-americano: o ensino que sobrecarrega a inteligência e
afoga a livre iniciativa da criança, o imperialismo ianque, espreitando a oportunidade para apoderar-se
de nosso território em nome de uma proteção que não precisamos”, a figura dos ditadores, a falta de liberdade,
a imensa pobreza de seu povo, seu
estoicismo inútil.
Ainda
assim, a de Rômulo Gallegos pode se
constituir uma visão elitista, como o entendem alguns, visão típica de uma
sociedade dividida em castas. Mas, o haver se detido no “homem deformado sem
culpa” que habita as terras do Continente, já é uma razão para ser lido pois
essa leitura pode levar à formulações e à reformulações que são, mais do que
nunca, imprescindíveis para todo e qualquer latino-americano.
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