A
primeira obra de Eduardo Galeano não é conhecida do leitor brasileiro. Tampouco a segunda.
Publicadas em 1963 e 1967, Los dias
siguientes e Los fantasmas del dia
del leon, respectivamente um romance e um livro de contos não atravessaram
fronteiras o quê, em se tratando de
fronteiras latino-americanas – no que se refere à material bibliográfico
– é bastante comum. O raro e, felizmente, isto pode acontecer, é a presença de
um Eduardo Galeano no mundo editorial brasileiro onde o número de autores
latino-americanos traduzidos, em relação à importância e à quantidade de outros tipos de textos de qualidade
duvidosa que tem a sua divulgação no Brasil garantida por uma política
subserviente e nefasta, é muito reduzido.
As
quatro obras de Eduardo Galeano traduzidas e publicadas no Brasil apontam
para um interesse do leitor que outros
escritores, embora conhecidos internacionalmente há mais tempo, não conseguiram
despertar. Nem mesmo vencer um anonimato que só o tradicional desconhecimento
que os latino-americanos nutrem através de gerações, uns em relação aos outros,
pode explicar. Como é o caso, aliás, de
um Francisco Espínola ( o Paco Espínola citado por Eduardo Galeano ) de quem ,
um único texto, o conto “Rodriguez”
seria suficiente para colocá-lo entre os melhores contistas latino-americanos.
Em
1975, ano em que foi publicado, pela Sudamericana, La canción de nosotros, foi traduzido Vagamundo. Três anos depois, As veias abertas da América Latina, A canção
de nossa gente e Dias e noites de
amor e de guerra. Os contos, o ensaio, o romance e os relatos de Eduardo
Galeano. Nestes, a necessidade de contar o amor, o prazer dos sentidos, o
sofrimento de ver cair mais um companheiro, o esboroar-se de um trabalho. O eu
não é detestável mas, na América Latina, espaço mais do que tudo de
prioridades, ele é menos importante e
cede lugar, obliterando os plátanos e as gaivotas de Montevidéu, seu cheiro de
mar e de carne na brasa, para falar nos outros. E os pequenos textos se tornam
belos momentos líricos nesse enlace homem/mulher, amigo/amigo, pai/filho,
avó/neto. Na maioria, porém, os momentos são decisivos para os marginais do
Sistema. Aqueles que fazem com que a América Latina seja mais do que um simples
território ocupado: o pintor, escritor, poeta, estadista, cantor, ensaísta,
antropólogo, jornalista. Lembrados como
cidadãos numa atividade do cotidiano e depois como vítimas condenadas ao
silêncio ou à morte. As figuras, então, desaparecem mas
fica o heroísmo teimoso, entre a dúvida e o medo que levam à outro
espaço onde vai se repetir a mesma luta desigual: Argentina, Brasil, Chile,
Equador, Guatemala, Venezuela. Presos. Torturados. Desaparecidos. Exilados.
Mortos.
Os
pontos de interrogação se alargam para o leitor. Perguntas de respostas
desconhecidas. Perguntas que ele, Eduardo Galeano, não responde e que poucos
responderão.Porque talvez seja muito mais penoso do que indagar – poço
publicar? – o questionar a utilidade do ato de escrever.
Para
quem leu as obras anteriores de Eduardo Galeano é vidente a insistência em
narrar certos fatos que são comuns e cotidianos na América: o Sistema, a Máquina. E’quando a ficção e o depoimento – que são
esses relatos, se entrelaçam. Certos
verbos se repetem: bater, atirar, prender, matar, ferir, delatar, torturar,
repetindo os que aparecem ou apareciam
na Imprensa.
Sem
dúvida, a busca de liberdade é valida e
inadiável; possuí-la é poder, também, denunciar o que corrói os países e
massacra o povo. Esta foi a opção de
Eduardo Galeano. Mudados que sejam um nome por outro, um fato por outro, um
lugar por outro o que é narrado em Dias
e noites de amor e de guerra é matéria sobejamente conhecida. Mas, como
aquele personagem que punha numa caixa recortes de jornal para reler de vem em
quando e, assim, não deixar esmorecer sua indignação, o livro de Eduardo
Galeano é de leitura imprescindível e
urgente.

Nenhum comentário:
Postar um comentário