domingo, 13 de dezembro de 1992

Pedras, farpas e perdas

         Melancólico, triste, quase sempre como que desesperançado é o olhar de Celso Mauro Paciornik para o mundo. Mundo feito de tangíveis, próximos e, sabidamente, irreversíveis desacordos que só uns poucos sabem ver e, raros, os que podem transformar em matéria poética.
 
         Indagações do eterno, certezas inclementes sobre um futuro que, certamente, irá se refazer ao som de um gotejar de botas / e de esgotos. Permanência irrecusada na solidão.
 
         E, os poemas livres e indisciplinados, se fazem de agressões e ternuras: a palavra forte, o forte constatar da miserável mesmice que se perpetua, intocada, e se impõe no Continente.
 
         O dizer que se mascara em ironias, em sarcasmos mas não tenta esconder a dor de viver o que não impede o poeta de ser solidário ainda que fale de si mesmo.
         Algum Brasil se desenha, então em tênues mas reconhecíveis linhas: o Brasil dos brasileiros que do Oiapoque ao Chuí, cegos, suspiram diante da ilusão televisiva; o Brasil da tortura, da retórica sem sentido, das declarações mentirosas, dos impostos surrupiados.

         Angústias pessoais, porém, e sentir-se entre as desarmonias de que o mundo é cheio não desarvoram Celso Mauro Paciornik. Como síntese de um estar diante da vida, quatro verbos de ação - andar, pensar, fazer e perguntar - comandam “Inspiral”, o primeiro poema de seu livro Inversos tempos (São Paulo, Estação Liberdade, 1992). E, expressão de um querer preciso, a última estrofe do poema “Sagrada intolerância”: Quero ver pender / da estátua caolha e brega da Justiça / a chusma toda algoz de traficantes / de verbos, vidas, vontades e verdades / que reinventa o mundo à sua podre imagem / e semelhança / e das próprias fezes se envergonha / a ponto / de não sentir seu cheiro.
 
         Este querer que o levou à luta política e a pagar não pouco por ela nos tempos em que ver a realidade do país era condenável. E um crime sem perdão o desejar mudá-la.
 
         Agora, as palavras são permitidas. Em Celso Mauro Paciornik elas não estão livres de amargura que encontram algum alívio na troça e no lúdico. Mas propor-se a dizê-las e, buscando um interlocutor, publicá-las, mais do que “humana teimosia” é alimentar-se de uma esperança.

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