Então o arcabuzeiro, em vez
de afastá-la ou impedí-la, lhe segurou o índio pelos ombros, quase com
suavidade e já teve nas mãos a cortada cabeça que ela lhe estendia num gesto de
enojado horror e de arrependimento. CarlosDroguett.
Supay el cristiano
Em 1967,
pela Zig-Zag de Santiago, era publicado Supay
el cristiano, romance de seis capítulos que se inicia mostrando Pero Sancho
de Hoz imerso em profunda tristeza e perfeito mutismo, resultantes dos dias que
passou nas prisões de Lima.
Segundo a historiadora Carmen Pumar Martínez, no seu
livro Pedro de Valdivia fundador do
Chile (Madrid, Anaya, 1988), ele havia chegado da Espanha trazendo consigo
uma designação real para conquistar o Chile, quando Francisco Pizarro já havia
outorgado a empresa a Pedro de Valdivia. Para não contrariar a vontade real, o
governador do Peru decidiu que iriam para a conquista juntos e que se
repartiriam as despesas e os lucros advindos da aventura
Pero
Sancho de Hoz, no entanto, não consegue cumprir o estipulado - deveria se encontrar com Pedro de Valdivia
quatro meses mais tarde, levando cinqüenta cavalos e duzentas couraças - e,
então, trama a morte do sócio e rival. A tentativa, porém, fracassa e acusado
por aquele que teria sido sua vítima de ter faltado às promessas é eliminado da
sociedade e mantido, conforme seu desejo, como soldado raso, sem armas, nas
hostes do conquistador.
Mas, não
desistindo de eliminar Pedro de Valdivia, participa de nova conjura que
igualmente fracassa e é preso com grilhões. E assim estava quando a recém
fundada Santiago é atacada pelos índios. Ainda que acorrentado, luta ferozmente
e assim, pelo valor demonstrado recebe, de volta, a liberdade.
Diz o crítico Teobaldo Noriega (La novelística de Carlos Droguett: aventura y compromisso, Madrid, Pliegos, 1983) ser Pero Sancho de Hoz o eixo central de Supay el cristiano e de 100 gotas de sangre e docientas de sudor, também publicado pela Zig-Zag, em 1961 e que juntamente com El hombre que trasladaba las ciudades compõe a trilogia da conquista, de Carlos Droguett.
Diz o crítico Teobaldo Noriega (La novelística de Carlos Droguett: aventura y compromisso, Madrid, Pliegos, 1983) ser Pero Sancho de Hoz o eixo central de Supay el cristiano e de 100 gotas de sangre e docientas de sudor, também publicado pela Zig-Zag, em 1961 e que juntamente com El hombre que trasladaba las ciudades compõe a trilogia da conquista, de Carlos Droguett.
Nas
primeiras páginas de Supay el cristiano,
Pero Sancho de Hoz domina o primeiro capítulo, “El hombre más triste” em que premedita
e tenta o assassinato de Pedro de Valdivia e, brevemente, aparece no último
capítulo quando se defende dos invasores da cidade.Entre esses dois fatos de
sua vida, o romance se constrói em episódios da conquista do Chile: a
exploração da mina de ouro Marga-Marga pelos espanhóis, a construção de um
barco na costa de Concón, a luta na qual é preso o cacique Michimalongo, a
prisão dos sete caciques, a prisão e a morte de um traidor espanhol, o ataque
dos indígenas à cidade e a morte dos caciques.
Uma ficção
que teve sua gênese no momento em que o escritor, preparando uma tese com a
qual deveria terminar o curso de Direito, se debruçava sobre os textos dos
cronistas e dos historiadores.Desses textos é que emergem os episódios e os
personagens do romance. Como os personagens vivem esses episódios e como os
sentem é que a crônica da conquista é reescrita em textos ficcionais exemplares
como o que descreve a execução dos sete caciques presos como reféns por Pedro
de Valdivia.Encurralados pelos indígenas na cidade que se incendiava, os
espanhóis temem estar perdidos mas querem resistir e repelir os atacantes. Então,
se levanta a voz de Inés Suárez, a única mulher presente nessa conquista,
partilhando o destino e o leito de Pedro de Valdivia, para ordenar que os
caciques sejam mortos.
O texto de
Carlos Droguett é construído em rápidos diálogos entre Inés Suárez e o tenente
Alonzo Monroy e longas descrições do combate.Na tensão que se estabelece entre
a mulher que manda executar prisioneiros inocentes e o militar que busca ser
justo se desenham os caracteres.Inés Suárez, que se move entre o medo, o
desprezo, a raiva, a insegurança, a tristeza para se deixar vencer pela insana
coragem da qual não está isento o arrependimento nem o nojo; Alonzo de Monroy,
tranqüilo, mergulhado em profunda solidão junto ao silêncio dos demais
espanhóis, tem a certeza daquele que se apóia em normas. A dúvida o leva a
baixar a voz para reafirmar a sua negação em matar os caciques - são reféns - e
mais uma vez reafirmar com firmeza - são reféns.
Ao redor
de seus desejos - o de matar para se salvar expresso por Inés Suárez, o de
poupar os que estão presos e lutar contra os que atacam reafirmado por Alonzo
de Monroy - a realidade das flechas e da fumaça, dominando a praça a se oferecer aos olhas de um narrador que
descrevendo o sofrimento dos soldados e dos cavalos presos, mostra uma visão da
conquista claramente comprometida com o homem que a realizou ou que a sofreu.
O
terror se instala entre os índios domesticados que procuravam refúgio entre as
patas dos cavalos; a dor se instala nos cavalos que, amarrados, não podem fugir
das flechas e do calor do incêndio; o sopor, a sede o cansaço aniquila os
soldados. E os caciques presos estavam
aí, como uma única trouxa, unidos todos por uma só corrente. Eram fortes,
robustos, pareciam tranqüilos, estavam descansados, eram os únicos que não
estavam sofrendo.
Inés Suárez
olhou para eles que imóveis permaneciam e indiferentes aos gritos e aos gestos
que os rodeavam. Ignoravam que, um a um, seriam decapitados e que suas cabeças
seriam jogadas sobre os atacantes da cidade que entre alaridos e correrias
fugiam do horror e do desespero.
Na cidade
espanhola, os sete corpos dos sete caciques, sem cabeça, se amontoavam sobre as
correntes que ainda os mantinham unidos.


