domingo, 7 de janeiro de 1990

O sentido do romance no Continente

            Elaborando-se sob o signo das transformações, a Literatura Latino-americana se encontra, hoje, mais do que nunca, num momento de auto-afirmação. Auto-afirmação que se revela quando o emissor adota uma posição de ruptura ideológica com os valores tradicionais da classe dominante e assume seu povo, suas vozes, seu destino: quando o texto se constitui um testemunho formal dessa ruptura ao deixar de repetir a linguagem dos colonizadores para ser um conjunto de significações desse povo mestiço, dessas vozes sussurrantes que ele, talvez, ajude a mudar.


            Se o emissor escolhe a ruptura, se o texto é testemunho dessa ruptura, se o receptor procura razões de fé na sua ficção, a crítica literária não deveria se afastar desse testemunho, dessa ruptura, dessa busca, mas, ali encontrar sua gênese.

            Sendo a Literatura Latino-Americana  dúvida, indagação, denúncia, grito de alerta, a busca de seu sentido é, também, a busca desse mundo que existe a seu redor. Um mundo onde tudo – direitos, obrigações, propriedades – são distribuídos de acordo com o desejo de alguns; onde é evidente a possibilidade que existe para que um homem ou um grupo de homens realize a sua vontade ainda que em detrimento dos demais.

            Seja a discussão e repúdio da parte dos escritores, seja a busca de soluções da parte dos sociólogos, ambas contém o desejo comum de conscientizar. Sobre as lutas e fracassos,a fome, a violência, o desemprego, a opressão,a morte. Sobre o domínio de alguns sobre a massa de deserdados que constitui a população latino-americana.

            Estrutura social que pode ser estudada, cientificamente, a partir de sua estrutura econômica, ideológica e jurídico-social. Recreada, porém, num universo romanesco, essa estrutura social que repete a estrutura d e uma sociedade real, poderá ser passível de uma análise cuja base seja a mesma teoria científica usada para estudar a sociedade real. Então, será possível perceber que, muitas vezes, as “trouvailles”estilísticas, os avanços formais do romance latino-americano contemporâneo não impedem um mimetismo ao reproduzirem as estruturas de uma sociedade concreta.

            Disse Grivel que o romance é uma das vozes da classe dominante se o escritor se origina dessa classe e assume suas intenções. Utilizando, porém, o romance como instrumento, pode fazer dele uma arma, uma denúncia contra essa classe, embora ela seja a sua.

            Sem dúvida, um ponto de partida para  reflexões que alcancem, também, o contexto e que torne possível a generalização de outro sentido que não seja aquele da classe dominante.

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