domingo, 13 de novembro de 1988

O mundo maravilhoso de Piquín e Chispita

               Serafin J.García, poeta e narrador uruguaio da cidade de Treinta e Três é, sobretudo, conhecido por Tacuruses. Um livro de versos que teve sucessivas edições porque, além de muitas outras qualidades, é expressão perfeita da voz do gaúcho que, sobrevivendo às transformações sociais,  submetido pelas leis do trabalho, tenta, ainda, se manter livre.É’, também, autor de contos e de relatos infantis, muitos dos quais  são livros textos nas escolas uruguaias. Um deles, Piquín y Chispita foi relacionado entre os dez melhores livros infantis, publicados em 1967/68 com vistas ao prêmio internacional Hans Christian Andersen de 1970.

              Ao sair de sua toca subterrânea, pela primeira vez, o tuco-tuco Piquín fica maravilhado com  o radiante céu azul, o rio largo e de águas prateadas, os ondulados campos verdes, o sol brilhante. Ele somente desprega os olhos dessas belezas para ver Chispita, a lagartixa verde. Simpatia mútua, palavras trocadas e juntos decidem ver o mundo.         Suas descobertas vão acontecendo. Cada capítulo do livro é uma aventura. O encontro com João Sem Medo que, apesar do nome (ou, por causa dele), diante do perigo se põe a tremer e quer fugir; ou com o boi Sem Pressa que os ajuda a atravessar o riacho; o espetáculo feérico dos vagalumes dançando no céu....

               Cada encontro, um favor recebido, um favor prestado: Piquín abrindo um túnel para livrar os peixes das presas do lobo que os havia aprisionado para se poupar o trabalho de caçar; ou cavando galerias subterrâneas que, ao deixar o solo sem firmeza assustaram a capivara  cuja avidez herbívora deixava  sem alimento outros pequenos animais.

               E, assim, as aventuras se sucedem. Encantadoras num mundo de planícies, de arroios cantantes, de aromas silvestres e pontilhado de borboletas coloridas. Um mundo em que a maldade, quando existe, é a expressão da luta pela sobrevivência. Para  que reine  a harmonia, trabalham alguns e entre eles, Piquín e Chispita.

               Mais de vinte e cinco anos se passaram desde a primeira edição dessa história. O mundo mudou e na velocidade das mudanças muita coisa se perdeu. Outras chegaram: imagens de mundos mecânicos e personagens robotizadas, movidas, em lugares estranhos, por forças fantásticas e inumanas. Nos estereótipos, a luta entre o Bem e o Mal contém significados a serviço de verdades que servem a uns em detrimento de outros. Como se não houvesse mais espaço para bichinhos ingênuos e espaços luminosos, é imposto, hoje, um outro mundo infantil que o despreparo dos países do Terceiro Mudo aceita sem discutir, ignorando que valores se transmitem e que somente eles podem evitar que o Continente continue a perder a sua identidade.

                 Ao oferecer em Piquín y Chispita a natureza em que o tom e as cores e os seres são nossos e com eles, cenas de amizade de altruísmo, Serafín J. García não apenas encanta seus pequenos leitores. Também faz pensar: já é tempo que o Continente conte para seus filhos suas próprias histórias

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