O
Cometa, Maria Rosa e Gaspar Mora. Um longínquo e estranho triângulo amoroso.
Maria Rosa, amando doidamente Gaspar Mora. Gaspar Mora, alheio a tudo, preso na
muralha de sua doença, morrendo na beira de um riacho seco. E o Cometa. Impassível como parecem os astros
diante da dor dos humanos, cumprindo, ao passar, nada mais do que o seu
ritualístico destino.
Foi no tempo em que o
Cometa apareceu no céu e aproximou, ameaçadoramente da terra sua imensa cauda
de fogo. No Continente, a terra seca, o sofrimento, a lei dos homens.
Também, sobretudo, um entrelaçar de ódios, amores, crenças e enganos.
Hijo de hombre, o primeiro romance de
Augusto Roa Bastos, foi publicado em 1960. Na época, o romanista paraguaio
tinha quarenta e três anos. Nascera sete anos depois da passagem do Cometa .
Seu personagem narrador, contando a história do carpinteiro Gaspar Mora e de
Maria Rosa, lembra do espanto de seus cinco anos, profundamente comovidos pela
presença terrível da víbora de fogo que ia engolir o mundo. Perplexo, também,
diante da figura do leproso, músico e escultor, escondido do mundo, no meio do
mato, cuja enfermidade não foi suficiente para afastar dele o amor das
mulheres, o amor de Maria Rosa e a admiração dos homens.
Maria
Rosa, amando à distância, levando-lhe oferendas de pequenos pães, das bananas maduras, da água do
manancial. Isso, até a chegada do Cometa. Era
o anúncio resplandecente do fim do
mundo. A notícia terrível do castigo se amplificava na igreja, entre os
lamentos e as rezas. Depois, começou a seca, era como se o monstro tivesse
acabado com a água da terra e do céu. Foi quando Gaspar Mora desapareceu. Dele
ficou o Cristo na Cruz, esculpido na madeira, as manchas de pus maculando a
forma criada à imagem e semelhança do artista.
A
imagem, carregada nos ombros, foi levada para a igreja, numa estranha procissão
que avançava sem rumo, sem lar, sem destino, pela solitária, vasta
pátria dos deserdados e dos tristes. E lá ficou no átrio, esperando pelo
padre durante vários dias pois ele só vinha a Itapé em raros domingos.
E’obra de um lazarento disse o padre ao chegar. Há o perigo de contágio.
A casa de Deus deve estar sempre limpa. E’o lugar da saúde... Mas o
argumento sobre os bacilos e os riscos da contágio não possuía validade para a multidão que escutava com os olhos
vazios fixos no Cristo, na lembrança daquele que o fizera: o carpinteiro
leproso que liquidava as dívidas dos agricultores prejudicados pelo granizo ou
pelos gafanhotos: o mesmo que ofertava
agasalhos para as viúvas e para os órfãos e que fizera a escolinha. Nunca ele
pisara na Igreja. Um herege, dizia o
padre. O velho Macário dizia, um puro.
De seu rosto limpo, forte e moreno, ossudo, dos seus olhos mansamente verdes
ainda continuava apaixonada Maria Rosa. Maria Rosa, parte de um universo de pó
e de miséria como ela própria. Universo submisso ao